O Poder Judiciário quer saber os motivos que levaram o estado a suspender o repasse de leite para bebês, cujas mães são portadoras do vírus HIV. O despacho do juiz Ygor Figueiredo, da vara da infância, foi proferido na tarde de ontem, três dias após a Defensoria Pública do Estado (DPE/AL) impetrar ação civil pública pedindo para que a Secretaria de Estado da Saúde normalize a distribuição da forma láctea infantil para crianças de 0 a 12 meses, cadastradas nos serviços de referência no tratamento de portadores de HIV no estado, em um prazo de cinco dias.
De acordo com o coordenador do Núcleo de Direitos Coletivos e Humanos da Defensoria Pública e autor da ação, o defensor público Daniel Alcoforado, em Alagoas estão cadastradas pela Sesau, nas unidades referenciadas para tratamento dos pacientes com HIV, mais de oitenta crianças que dependem da fórmula láctea como única alternativa nutricional em substituição ao leite materno. Segundo o defensor, estas crianças expostas ao HIV têm sofrido há vários meses com a regular descontinuidade da distribuição do leite.
“O estado está inserido no programa de acompanhamento e tratamento de pessoas portadoras de HIV/AIDS. A Sesau, dentre os serviços disponibilizados, tem a distribuição de fórmula láctea para as crianças expostas ao vírus nas maternidades públicas e conveniadas ao SUS principalmente nas unidades de referência no tratamento da doença (AIDS). Tais ações recebem incentivo financeiro do Ministério da Saúde”, disse o defensor.
O não repasse contínuo do insumo tem gerado preocupação à Defensoria Publica. “O perfil socioeconômico da grande maioria dessas famílias que dependem da distribuição do insumo alimentar infantil sobrevive com renda abaixo de 1 salário mínimo ou até mesmo tendo como única fonte de renda os benefícios sociais do Programa Bolsa Família, sendo fácil constatar que, sendo esta a única fonte de nutrição para esses infantes, a descontinuidade do serviço tem o condão de colocar em risco a saúde e a vida das crianças”, ressaltou o defensor.
Três unidades referenciadas informaram sobre o desabastecimento do insumo e advertiram sobre os riscos advindos dessa falha estatal. “Eles relataram que nos períodos freqüentes de desabastecimento, as equipes do programa DST/AIDS constatam que as mães, desesperadas pela falta do leite artificial, começam a amamentar seus filhos, aumentando consideravelmente as chances de infecção dos bebês pelo vírus do HIV. Há relatos ainda de mães que chegam nas unidades com mamadeiras contendo diversos tipos de farinhas e outros leites não indicados para recém-nascidos, acarretando severos prejuízos para a saúde das crianças, como quadro de diarréia aguda e perda de peso”, disse.
Vale ressaltar, que a Defensoria Pública de Alagoas, antes de ingressar na Justiça, oficiou e manteve contatos diretos com a Secretaria de Saúde, porém, o problema não foi resolvido.
SEM INSUMO
No Hospital Universitário Prof. Alberto Antunes, por exemplo, que atende aproximadamente 40 crianças expostas ao HIV, até o momento o pedido mensal não foi atendido pela Secretaria de Saúde, não existindo mais estoque para distribuição às crianças que necessitam do leite.
De igual modo, o serviço do PAM Salgadinho, que atende aproximadamente 50 crianças, informou que também não há estoque da fórmula láctea destinada às crianças com idade de 6-12 meses, existindo somente 155 latas para crianças de 0-6 meses, quantidade suficiente apenas para os próximos 15 dias.
Substituição do leite
No Brasil, o Ministério da Saúde, através da Secretaria Nacional de Vigilância em Saúde recomenda a substituição do aleitamento materno pelo leite artificial para crianças expostas ao vírus. Tal ação assegura a proteção à vida e possibilita a diminuição das chances de a criança ser infectada pelo HIV por meio da Transmissão Vertical.
Dados do próprio Ministério da Saúde demonstram que o aleitamento materno representa riscos adicionais de transmissão, que se renovam a cada exposição da criança ao peito, e situa-se entre 7% a 22%. Esse risco se eleva, sendo de aproximadamente 30%, quando a infecção da mãe ocorre durante o período de amamentação. Por esse motivo, o aleitamento materno e o aleitamento cruzado (amamentação da criança por outra mulher) estão contraindicados.